Nota de presentação do livro
O
voo noturno das galinhas,
de Leila Guenther,
publicado em 2006
Os textos reunidos neste livro, mesmo os mais curtos, são
histórias completas. Ou talvez fosse mais exato dizer que são gestos completos
de linguagem, dotados da extensão apenas necessária para que se patenteie o seu
sentido e se perceba o corpo do qual procedem e que os dinamiza.
Não obstante, o leitor logo perceberá que não tem diante de
si uma mera coletânea de contos e minicontos, mas sim um conjunto
significativo, dotado de uma secreta arquitetura, que, sem prejuízo da
autonomia de cada um deles, os reorganiza e ressignifica como momentos autônomos
de um desenho amplo, cujo vetor e sentido só se percebem ao final da leitura.
A coerência estilística também reforça a unidade do
conjunto: moldados com mão leve, mas de grande firmeza, os vários textos aqui
reunidos exibem todos uma escrita precisa, que não faz alarde do trabalho de
depuração, nem exibição de pirotecnia narrativa.
Contida e elegante, a linguagem de Leila Guenther não é,
entretanto, despida de relevos e surpresas, que se manifestam a cada passo, sob
a superfície polida do fluxo narrativo. Nesse universo minimalista, um torneio
de frase, um advérbio ou a escolha precisa de um vocábulo bastam para
testemunhar e trazer subitamente para primeiro plano a massa de energia e os
movimentos profundos que se cristalizaram, em seqüência, nessas narrativas breves.
A sensibilidade ao mesmo tempo delicada e agônica, combinada
à linguagem correta e ao tom confessional, faz assim de cada história desse
livro um momento tenso, no qual a energia aparece contida, mas prestes a
estalar os limites que o narrador aceita ou taticamente se prescreve. Como se
cada uma delas fosse uma mola, imóvel porque presa por um fio.