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quinta-feira, 6 de abril de 2023

Leo Vaz

 Alexandre Eulálio conheceu Leo Vaz. Gostava dos seus livros e gostou de saber que eu também. Na verdade, houve uma época em que pensei seriamente em lhe dedicar um trabalho mais longo. Queria escrever – e o faria ainda se tivesse força para isso – um estudo sobre um tipo de literatura que ficou soterrada pela aluvião da herança modernista. Pensava em centrar o trabalho sobre dois livros, “Vida ociosa”, de Godofredo Rangel, e “O professor Jeremias”, de Leo Vaz. Ambos publicados em 1920. Alexandre, como é fácil imaginar, adorou a ideia. Como incentivo, um dia me apareceu com o exemplar cuja foto vai anexada. Eu tinha defendido o mestrado no ano anterior ao da dedicatória. Queria que ele me orientasse, mas ele se recusou. Não tinha formação, dizia. Não era um acadêmico. Era um diletante.

Agora há pouco, arrumando os livros, deparei com esse exemplar meio esquecido. Junto com ele, o primeiro que li do autor, quando ainda era muito jovem, e que Alexandre menciona na dedicatória. Só depois, já durante o mestrado, vim a conhecer essas “Páginas vadias”, e ainda “O misterioso caso de Ritinha”, que era uma segunda edição “sorrateiramente aumentada pelo autor”, como se lia no frontispício.

Ao folhear esses volumes, fiquei matutando. Autores como Leo Vaz e Godofredo Rangel praticamente desapareceram. Do último, houve recentemente uma reedição em grande estilo, que recebi de Wander Melo Miranda. Mas de Leo Vaz não creio que se tenha reeditado nada de modo sistemático. E não tive notícia de estudos universitários sobre esse filão ainda por explorar e avaliar, que foi a prosa que nasceu ao lado ou mesmo antes da modernista e depois correu ao lado dela.
Lembro-me também de ter lido, na época, entre outros, um escritor de Piracicaba, em cujos livros encontrei muita boa matéria para reflexão, principalmente sobre o que eram os serões da pequena classe média nas pensões onde viviam estudantes e funcionários para os quais a cultura literária e linguística era um capital importante para o sucesso e a ascensão possível.

Cheguei a comentar com Antonio Candido sobre esses tópicos de interesse, e foi uma desilusão. Sua resposta foi que aquele escritor especialmente era um chato, que lhe enviava todos os livros, mas que ele nunca tivera paciência de ler. E concluiu que ali, naquele campo em que eu pretendia laborar, pouco haveria de fato de interesse. Não concordei. E não foi por isso que desisti do trabalho e enveredei pela literatura portuguesa. Foi, sim, justamente para escapar de algo que me parecia complicado, que era a assunção dos preconceitos modernistas, na esteira da vaga acusação de “anatolianismo” com que Mário de Andrade, se não estou em erro, fustigou os não-modernistas da linhagem que me interessava.


Em todo caso, trouxe para a mesinha de cabeceira agora à noite o Leo Vaz, mesmo com o risco pulmonar dos farelinhos de papel e dos restos de poeira imbricados nas lombadas. Quem sabe me animo ainda um dia.