quinta-feira, 29 de setembro de 2022

Um colóquio

 Amanhã (30/09/2022) terá lugar, no Instituto de Estudos Brasileiros da Universidade de Coimbra, um colóquio sobre ensino de literatura. Servirá de pretexto ou de provocação para a boa conversa, o livro publicado recentemente pela Editora da Unesp.

Apesar se sempre me apresentar e definir como "professor", e quase nunca como “crítico” ou “pesquisador”, acabei por escrever pouco sobre a atividade docente, sobre a sala de aula. O que não deixa de ser estranho, já que foi a ela que mais me dediquei e que a maior parte do que escrevi ou nasceu dos cursos e da sua preparação, ou teve a sala de aula como auditório imaginado.
É, portanto, com grande alegria que aguardo os podcasts das intervenções, que logo serão disponibilizados pelo IEB.
Ao pensar no que poderia dizer num vídeo que será reproduzido no início do colóquio (infelizmente compromissos médicos me impedirão de acompanhar a jornada), lembrei-me dos primeiros anos como professor da Unicamp.
Naquele tempo, a estrutura do curso de Letras do IEL e o ambiente do Departamento de Teoria Literária exerciam uma considerável pressão para que os projetos de pesquisa e a carreira dos docentes se confinassem aos estudos brasileiros.
É certo que eu poderia ter seguido o caminho previsto, tanto com um primeiro projeto sobre escritores mais ou menos esquecidos, como Leo Vaz e Godofredo Rangel, quanto com um segundo, sobre “Invenção de Orfeu”. Mas o que eu via como estreiteza do ambiente e do programa nacionalista terminou por me dirigir à pequena área de literatura portuguesa, onde encontrava um espaço de respiração fora do aquário onde circulavam os discípulos de Antonio Candido à volta das questões nacionais.
Foi nessa época que me aproximei de Haquira Osakabe e mais ainda de Alcir Pécora. E foi assim que se deslocou para mim o centro de interesse e vida intelectual: do DTL para a casa do Haquira, onde nos reunimos muitas e muitas vezes para discutir textos, pegar livros emprestados e, principalmente, programar os cursos de Literatura Portuguesa, que incluíam sempre uma situação dos autores e obras portuguesas no quadro maior da literatura europeia.
A compreensão desse enquadramento era central para Haquira, bem como a necessidade de estudarmos todo o arco temporal compreendido pela Literatura Portuguesa. Para isso, insistiu na ideia de que todos os professores da disciplina passassem por todos os cursos. Assim, cada um de nós teve de, pelo menos uma vez, ensinar literatura medieval, renascentista, oitocentista e moderna. E como havia pré-requisitos entre as matérias, discutíamos e encontrávamos linhas de continuidade de um semestre para outro, assim como otimizávamos a bibliografia de cada um.
Na sequência, os estudos com Alcir e as muitas leituras e trabalhos que fizemos juntos terminaram por decidir os rumos que tomei.
In illo tempore, nós dávamos poucas aulas no IEL. Tínhamos um semestre inteiro para preparar o curso do seguinte. E foi nesses longos períodos de estudo, tendo em mente a boa estruturação e as boas aulas, sempre em diálogo com os professores de literatura portuguesa, que completei a minha formação intelectual.
Embora o perfil dos cursos e alunos fosse mudando ao longo das décadas, e fosse aumentando a carga burocrática e administrativa na Unicamp, mantive sempre como prioridade a prática da preparação intensiva de aulas. Além disso, dediquei-me ao ensino de outra maneira, menos imediata: por meio da redação dos estudos que mais me deram satisfação e que mais considero: as introduções a clássicos, brasileiros e portugueses que escrevi para a Ateliê Editorial, tendo em vista os estudantes de ensino médio e dos primeiros anos da universidade.
Terminei por não contar essa história no vídeo gravado – história essa que não justifica o livro, mas, pelo contrário, o faz parecer exíguo, perante a importância do espaço da aula na minha vida – porque não queria me alongar muito naquilo que deveria ser apenas uma saudação e um agradecimento.
Agradecimento, aliás, que renovo aqui, ainda comovido com a proposta e realização desse colóquio sobre tema e livro que me são tão caros.

Nenhum comentário:

Postar um comentário